A cabrita Salomé:

Quando eu vinha voltano de uma pescaria
vi um quadro triste na moita do bambuzal
enroscada na placenta e no cordão umbilical
uma cabritinha agonizante se debatia.

Sua mãe tava morreno,ixibino um colar
enrolada no pescoço uma baita sucuri
quando vi aquela cena tratei logo de acudi
com muita força e corage consegui ela salvá.

Coitadinha sofreu muito mais conseguiu sobrevivê
tratei dela com carinho como se fosse da família
com bastante leite e capim fresco todo dia
assim devagarinho ela começô então a crescê.

E o tempo foi passano e ela se transformô
na cabrita mais bonita de toda a região
o formato de uma estrela de cinco salomão
nos pêlo avermelhado da testa desenhô.

Caminhava elegante a cabrita Salomé
facera mastigava umas folhas de capim
brincalhona ela gostava de ficá perto de mim
no varal ela mascava o vestido da mulhé.

A lei da natureza tem que ser respeitada
pra não vivê sozinha e sofrê de solidão
Arrumei um copanheiro pra alegrá seu coração
a Salomé precisava amar e ser amada.

Um bode da barba ruiva por nome de Araré
que o cumpadi Nicolino contrariado me vendeu
quando os dois se encontraro o amor aconteceu
bateu bem forte o coração da cabrita Salomé.

E o tempo foi passano,mudou toda a paisage
alegria tá presente,tudo é mais animado
os cabritinho pula e corre pra todo lado derrubei uma capoera,aumentei mais as pastage.

Orgulhoso observo a cabrita Salomé
os cabritinho brincalhão empina e dá cabeçada
na sombra da painera numa folga danada
tá mascano priguiçoso o bode Araré…

O meu Sertão

Eu não troco o meu sertão
por nenhuma capital
desculpe meu cidadão
por favor, não leve a mal.

Eu não sou contra a grandeza
e o progresso da nação
desculpe minha franqueza
eu prefiro o meu sertáo.

No sertão a vida é boa
melhor não precisa ser
tem riachos tem lagoas
tudo o que me faz querer.

A beleza se renova
sempre em cada amanhecer
é a natureza em festa
dá mais prazer em viver.

No sertão é diferente
tudo é simples e natural
o sertanejo inocente
vive sem fazer o mal.

Trabalhando o dia inteiro
cultivando o nosso chão
o progresso brasileiro
também vem do meu sertão.

Meu sertão é um paraíso
tem tudo que a gente quer
pra viver não é preciso
ir pra cidade qualquer.

Água eu bebo da fonte
a fruta apanho do pé
vou viver no meu sertão
até quando Des quiser…

A reza da Chuva:

A chuva não chegava e já era meis de setembro,
os mato estava seco fais muito tempo mais eu me lembro.

Como era costume do lugá fazê procissão pra chovê,
a mulherada preparano o andor
enfeitô de toda cor
feis o vermelho prevalecê.

A image de Santa Bárbara inriba daquele andor vermelho
antes de saí todo mundo de joelho
enfrente da igrejinha começaro a rezá.

Umas deiz mulhé,umas cinco criança
rezava na esperança de ver a chuva caí,andava pelas estrada da fazenda
cantando ave-maria,fazeno oferenda,
o andor vermelho chegava inté a reluzi.

De repente não se sabe de onde surgiu aquela vaca braba,
veio bufano inriba do andor de Sata Bárbara,foi uma baita correria.

Jogaro o andor no chão,correro por baixo das cerca,
por riba dos moerão,ninguém mais cantô ave-maria.

A vaca despedaçô a image da santa,
a mulherada ficaro com dor de garganta de tanto gritá e pedi ajuda.
Chovê que é bão não choveu,mais
o que aquela mulherada correu,
foi um tao de deus-nos-acuda…

Os Micos:

Peguei a foice,o machado e o facão
fui lá no mato catá lenha pro fugão
cheguei no mato comecei a campiá
graveto fino é mais fácil de carregá.

Fiz um fexe no capricho caprichado
e dispois amarrei bem amarrado
com embira do timbó,um pedaço de cipó
desxei ele bem seguro e apertado.

Guardei o pito atrais da minha zoreia
puxei a calça e apertei mais a correia
cuspi na mão e dei uma esfregadinha
pra pegá o fexe eu dei uma agachadinha.

De repente eu senti no meu trasero
um caroço duro batê em riba do rim
olhei pra riba,vi no cacho do coquero
dois macaquinho jogava coco em mim.

Fiquei zangado com aquele disaforo
os macaquinho jogava coco sem pará
eu o fazê estilingue do seu coro
da sua tripa faço isca de pescá.

Parece que os mico compreendeu
e saíro numa baita disparada
nos galhos das árvis se perdeu
sozinho eu fiquei dano risada.

Peguei a foice,o machado e o facão
garrei o fexe,coloquei ele na cacunda
quando fui andá dei um baita escorregão
caí sentado e machuquei a bunda.

Lá no alto da galhada,de repente eu vi
os macaquinho pulá de contentamento
ficaram alegre só por causa que eu caí
foi praga daqueles dois sarnento.

Devagarinho,capengano eu fui embora
cabeça baxa com vontade de chorá
a foice e o machado eu joguei fora
só levei o facão e uns graveto pra queimá….

O Moço:

O moço caminhava pela vida sem destino
nos sítios e fazendas fazia o seu itinerário
na poeira da estrada lentamente ia seguindo
carregava dentro do peito a dor do seu calvário.

Além da sua cruz uma velha mala de viagem
sangrava as feridas dos seus ombros já cansados
gravado na lembrança a visão de uma imagem
acompanhava passo a passo um fantasma do passado.

Mais ébrio do que sóbrio assistia à decadência
cambaleando procurava um lugar pra se esconder
seguindo o instinto da própria consciência
o moço andarilho tentou então sobreviver.

Um fazendeiro caridoso levantou ele do chão
cuidou dos ferimentos,estendeu um braço amigo
não perguntou nada nem pediu explicação
ofereceu trabalho e na fazenda deu abrigo.

Faltava experiência mas não faltava boa vontade
com o tempo aprendeu todo serviço dos peão
levantava bem cedo,trabalhava até bem tarde
quiz mostrar ao fazendeiro a sua gratidão.

O tempo foi passando e num domingo ensolarado
comemorava na fazenda com muita festa e alegria
um churrasco com rodeio pra alegrar os convidados
no aniversário da Lurdinha,oito anos ela fazia.

Tudo era alegria e no auge da festança
os peão se divertia na euforia do rodeio
sempre risonha brincava com outras crianças
a Lurdinha toda faceira com seu vestido vermelho.

Batia com força na peteca,berando a cerca do curral
uma vaca de cria nova veio correndo,desembestada
o vestido vermelho da Lurdinha era o alvo do animal.

Uma certeira cabeçada atingiu o peito da criança
foi jogada nas alturas,caiu por terra desmaiada
estava morrendo e ninguém mais tinha esperança
naquele lugar distante não se podia fazer quase nada.

Mas o moço andarilho pegou ela nos braços
ficou muito preocupado com a gravidade da lesão
o fazendeiro assustado seguiu os seus passos
mais atrás vinha o restante dos convidados e dos peão.

Sem perda de tempo deitou ela na cama
pediu água fervendo e pano limpo de enfermagem
fez uma prece confiante e manteve acesa a chama
com as mãos já calejadas abriu a velha mala de viagem.

Tirou de uma valise preta ferramentas de cirurgião
apareceu em sua mente lembranças do passado
ao dar à luz morreu um dia em suas mãos
sua mulher querida e seu filho amado.

Agitou com força a cabeça,voltou de nova à realidade
sem vacilar começou uma arriscada cirurgia
com mãos seguras mostrou a sua capacidade
a vida da Lurdinha somente dele dependia.

Conseguiu trazer de volta a vida da menina
mas pediu ao fazendeiro levar ela ao hospital
e dar prosseguimento no trabalho da Medicina
para ela ter no futuro uma vida sadia e normal.

Os médicos admirados da perícia e habilidade
das mãos que manejaram com destreza o bisturi
uma cirurgia difícil,de alta responsabilidade
somente com muito estudo poderia se conseguir.

Já de volta o fazendeiro procurou o salvador
pra beijar as suas mãos e agradecer sua coragem
mas o quarto vazio com tristeza encontrou
o moço foi-se embora com sua velha mala de viagem.

Carregando a sua cruz se embrenhou pelo sertão
guardou em sua memória um sorriso de criança
na poeira do caminho se perdeu na imensidão
a visão de uma imagem marcada na lembrança.

O tempo transforma tudo,Lurdinha em moça se transformou
e até hoje ela procura por toda perte do sertão
um moço andarilho que um dia por sua vida passou
e deixou uma cicatriz marcada em cima do seu coração.

O trem Carguero:

A casa que eu moro é singela e pequeninha
fica no alto da colina e avista toda região
nóis fica olhando o trem que passa pela linha
a mulecada se diverte com essa diversão.

Nóis escuita todo dia o seu triste lamento
que vem lá dos confim do meu sertáo
um apito rasga o espaço e se perde com o vento
se espalha nas planíce sobe as rampas do grotão.

O trem carguero comprido e vagaroso
no leito da estrada se arrasta lentamente
parece um dragão lerdo e preguiçoso
na boca da chaminé solta fagulhas icandescente.

O maquinista joga lenha na foguera da fornalha
o fogo esquenta a água que transforma em vapor
o vapor transforma em força e vence qualqué batalha
os trilhos aguenta firme mais os dormentes geme de dor.

Com esforço vai bufano,vai mostrano sua raça
transportano os produtos natural do meu sertão
o céu escurece com uma nuvem de fumaça
fico contano um por um a quatidade dos vagão.

Sacaria e minério de todo tipo,de todo porte
vai seno transportado no lombo do trem carguero
vagão-gaiola leva o gado destinado para o corte
no meio do comboio dois vagão de passagero.

O trem de ferro se arrasta vagaroso e pesado
leva o progresso do sertão para a cidade
eu também carrego nos meus ombros já cansado
o peso dessa vida nos vagão da minha idade…

O dia da daça:

No meu sitio tem de tudo,nele tudo acontece
essa estória aconteceu no finalzinho de janero
já passô bastante tempo mais a gente nunca esquece
morava na região um baita gavião do tipo carnicero.

Num domingo de manhã,de céu azul,bastante sol
as galinhas distraídas passeavam no quintal
sem sabê que o perigo morava nos arredol que nem curisco aparecia num mergulho fatal.

O carijó dava o alarme,mais chegava muito tarde
os pintinho esparneava nas unhas do gavião
eu ficava enfezado e me vinha uma vontade
de pegá o carnicero e mostrá pra ele uma lição.

Preparei meu estilingue,uns pedregulho de cascvalho
atrais da moita de tucaia esperei o malfeitor
tive boa pontaria,fui mais ligero que o raio
acertei ele no mergulho,rolô no chão, tremeu de dor.

A ave de rapina agora tava em minhas mãos
se trasformô em caça o carnicero caçadô
amarrei nas duas pernas uma peia de cordão
arranquei as penas dele,peladão ele ficô.

De asa aberta,amarrado,no meio do galinhero
as galinha arrodiaro o terror da vizinhança
meu galo índio vermeião,o mandão do terrero
com as esporas afiada começô sua vingança.

O gavião apanhô tanto,ficô mais mole que bagaço
fiquei com pena do infeliz que recebeu uma lição
foi embora cambaleano,trupicano no próprio passo
olhava com tristeza suas penas rolando pelo chão.

Dispois daquele dia ninguém mais ouviu falá
do carnicero perigoso que morava na região
naquele céu azul eu via no espaço a vuar
bando de passarinho,mais nem sombra de gavião.

Salada na puera:

Inté hoje eu me lembro do meu tempo de menino
morava com minha tia,e o meu tio Marcolino
no sul de Minas Gerais,no Sítio do Barro Fino
a terra dava de tudo,do melão inté o pipino.

Rabanete,beterraba,da terra tava saíno
tomate,feijão de vara,na taquara ia subino
pimentão e birinjela do pé já tava caíno
uma fartura danada tinha o Tio Marcolino.

Minha tia Maricota vivia me perseguino
eu vivia sempre correno,desceno e subino
no meio das prantação passava o tempo divertino
ela gritava bem alto:-Ô capêta de menino!

Não aperta a birinjela porque ela tá caíno
gritava do outro lado o meu tio Marcolino
não cutuca o tomate,não machuca o pipino
não derrube a taquara que o feijão já tá subino.

Gostava daquele tempo,hoje eu recordo sorrino
do meu cachorro rusguento que vivia só latino
eu brincava o dia intero no Sitio do Barro Fino
o meu tio resmungava:- Ô capêta de menino!

Não bilisca o jiló porque ele tá florino
não enrosque no cipó do melão e do pipino
minha tia Maricota e o meu tio Marcolino
gritava o dia intero:-Ô capêta de menino!

Usava como transporte o juriquinho Rufino
um balaio de cada lado pela estrada ia seguino
o meu cachorro rusguento mais atrais vinha latino
quando o jegue empacava eu ficava assistino.

O meu tio cutucava o trasero do Rufino uma taquara comprida,na ponta um prego fino
o jeguino dava coice no meu tio Marcolino
jogava tudo pra longe,na puera ia sumino.

Rabanete,beterraba,melância e melão
tomate,feijão de vara,birinjela e pimentão
mandioca e batatinha,inhame,cenoura e nabo
pipino,batata-doce,abobrinha e quiabo.

Tudo isso misturado,espalhado pelo chão
uma salada danada,uma grande confusão
o jeguinho se mandava,correno pelo estradão
inté hoje eu me lembro,guardo na recordação.

Quando penso no passado sem querê fico sorrino
minha tia Maricota e o meu tio Marcolino
me batia,me xingava:-Ê capêta de menino
larga mão de dá risada e trais de volta o Rufino!