FALSO MALANDRO.

Conversa fiada,
Conversa fiada. (BIS)
Ele diz que é malandro,
E de malandro não tem nada.

Dizia Bezerra da Silva:
Malandro é malandro,
Mané é Mané.
Malandro não carrega embrulho,
Não entra em fila pra ficar em pé.
Malandro é cobra criada,
Tira até proveito da situação,
Mas não entre em roubada
Pra não terminar indo pra prisão.

Conversa fiada,
Conversa fiada. (BIS)
Ele diz que é malandro,
E de malandro não tem nada.

Rio que tem piranha,
Jacaré nada de costas.
Quando o pau é torto,
Até a cinza é torta.
Malandro é o avião
Que voa sem bater as asas.
Mas tome muito cuidado
Que malandro demais,
Sempre se atrapalha.

Conversa fiada,
Conversa fiada. (BIS)
Ele diz que é malandro,
E de malandro não tem nada.

Quando ele chega no samba,
Ele se acha o tal,
Quer logo tirar uma onda,
Mexe com todo mundo,
Isso não é normal!
Mas já tão de olho nele,
Que é um falso malandro.
Tem gente afiando a navalha,
Logo o bicho vai tá pegando.

*Edmundo de Souza – Marcelo Maya – Selma do Samba

MEMÓRIA ATUAL (Prosa Poética)

Quando pensei que cavalgava, encontrei-me na estrada, decaído, machucado, dolorido… E ao abrir os olhos, apenas vi o manga-larga em pleno trote, se distanciando pouco a pouco. Acordei na urgência, entorpecido, e vi que tinham substituído o relógio em meu peito. De que adiantou tudo isto? Não substituíram o principal: o que armazena as lembranças. A minha memória atual! A dor, companheira de quem ama, continuava em mim.

UM DIA (Edmundo de Souza)

Você não me quis
Quando eu te quis um dia.
Você nem ligou
Quando pra ti eu sorria,
Quando quis te conquistar,
Quando tentei te mostrar
O grande amor que por ti eu sentia.

Mas o tempo foi passando,
E o sentimento acabando.
Conheci um outro alguém,
Hoje eu me sinto tão bem
Como nunca me senti um dia.

Aí você reaparece
Fazendo mil declarações,
Dizendo que sente amor,
Mas o seu tempo passou.
Só tenho algo a dizer
Você vai me esquecer,
Assim como esqueci um dia.

NOSSO AMOR MORREU

Perdoe-me
Pelo que vou dizer,
Mas não dá pra esconder
Esta situação.

Perdoe-me…
O sentimento acabou
Por tudo que se passou.
Espero compreensão.

É que nosso amor morreu,
Mas espero, juro por deus,
Que sejas realmente feliz
Nos braços de outro alguém,
Que possa querer tanto bem,
Como um dia eu quis.
Ah… Como um dia eu quis.

A vida é uma caixinha de surpresas,
De repente tudo se transforma.
Saio da sua vida pra outra estória,
Saio da sua vida agora.

*Edmundo de Souza – Selma do Samba

A trágica história de Romeu e Julieta

A trágica história de Romeu Montéquio e Julieta Capuleto

Foi na cidade Verona
onde deu-se antigamente
uma rixa entre famílias
cujo ódio era crescente
não havendo tolerância
a quem não era parente

Capuletos e Montéquios
tinham uma rixa antiga
Pelas ruas de Verona
cada família inimiga
pretextava um espirro
pra começo duma briga

Não brigavam só parentes
mas também os serviçais
e por causa do rancor
separando os rivais
terminavam em tragédia
os encontros casuais

Mesmo estando Verona
longe do fim da porfia
a família Capuleto
promoveu um certo dia
pra toda a sociedade
uma festa à fantasia

E o filho de Montéquio
conhecido por Romeu
com o rosto encoberto
neste baile apareceu
Por estar fantasiado
ninguém o reconheceu

Pela jovem Rosalina
ele estava apaixonado
Foi por ela que entrou
sem ter sido convidado
Mas a noite lhe daria
um encontro inusitado

A filha do Capuleto
que chamava Julieta
na flor dos anos voava
leve como a borboleta
revelando na ternura
a sua maior faceta

Querendo vê-la casada
sua mãe disse pra ela
que chegara o momento
do enlace na capela
sendo Páris candidato
a consorte da donzela:

– O fidalgo nesse baile
poderá estar presente
Externou-me o interesse
de ser o nosso parente
Vá agora para a festa
esperar seu pretendente

Ela foi para o salão
quase com indiferença
mas o mancebo Romeu
notando a sua presença
não conteve um espanto
por sua beleza imensa:

– Quem será a senhorita
que com ares de princesa
deixa meus olhos pequenos
pra verem tanta beleza
Se já fui apaixonado…
perdeu-se minha certeza

Depois de criar coragem
foi tirá-la pra dançar
Mas Romeu fantasiado
fez a dama acreditar
que era o fidalgo Páris
vindo pra lhe cortejar

E Romeu disse à dama
sem imaginar quem era:
– Vejo que a esperança
recompensa quem espera
Procurando uma flor
encontrei a primavera

Julieta embevecida
com doçura lhe falou:
– Quem procura sua flor
sabe quando a encontrou
esperando que ela diga
que também lhe esperou

Pois na continuação
do colóquio amoroso
Julieta apaixonou-se
pelo mancebo garboso
E Romeu correspondeu
com o coração ditoso

Teobaldo era um primo
por Julieta estimado
mas chegando no salão
viu Romeu fantasiado
Isso foi suficiente
pra deixá-lo irritado

Quando ele viu Romeu
a dançar com a donzela
calculou que estava ali
pra zombar da parentela
Fomentado pela raiva
disse para o pai dela:

– Não se pode imaginar
afronta maior que esta:
um Montéquio estar aqui
pra zombar da nossa festa
Precisamos expulsá-lo
com a honra que lhe resta

Prestamente Capuleto
foi censurar o rapaz:
– Sua presença Romeu
no baile não nos apraz
Não queremos um intruso
perturbando nossa paz

Por ter sido revelado
de repente seu disfarce
e ficar neste momento
sem ter como explicar-se
foi o jovem sem apelo
convidado a retirar-se

Vendo que o moço ia
descendo pelas escadas
sendo já ameaçado
pelo gume das espadas
Julieta confessou
para uma das criadas:

– O jovem que se retira
é um dos nossos rivais
Descobri isso bem cedo
e também tarde demais
Se eu não casar com ele
não pretendo casar mais

E Romeu desnorteado
foi fugindo pela via
sem direito a tentar
entender o que sentia
pois ainda contrafeito
Teobaldo lhe seguia

– Acabei de conhecer
o amor de Julieta
e não vou entrar agora
numa briga por veneta
Passarei a respeitar
uma outra etiqueta

Mas dobrando a esquina
duma rua sem saída
decidiu pular um muro
por correr risco de vida
Num jardim se escondeu
com a cautela devida

Foi ali que o rapaz
com a noite enluarada
avistou sua princesa
suspirando na sacada
Sem que ela escutasse
disse para sua amada:

– Vejo vindo na janela
como pérola que brilha
Julieta que eu já sei
dos Capuleto ser filha
Não será pra mim estorvo
ela ser dessa família

– Sei agora que o sol
quando chega do oriente
tem o céu para mostrar
seu encanto refulgente
mas ofuscado por ela
se esconde novamente

– Os olhos de Julieta
são estrelas cristalinas
revelando no seu brilho
esperanças femininas
com a ternura de flores
que se abrem repentinas

– Se agora escondido
não a chamo por um triz
só em ver a minha dama
eu já me sinto feliz
Mas agora vou calar-me
para ouvir o que ela diz…

– Ai Romeu! Diga pra mim
que você terá coragem
de rejeitar o seu nome
e deixar sua linhagem
mesmo que nosso futuro
não lhe dê outra vantagem

– Só por chamar-se Romeu
não serei sua inimiga
Pode a força da bondade
superar qualquer intriga
Transformar amor um ódio
não há nome que consiga

– O que é chamada rosa
consoante a um costume
com outro nome teria
o mesmo doce perfume
Mas Romeu estando aqui
ouviria meu queixume?

– Julieta, minha flor
eu estou ouvindo sim
Por fugir dos Capuleto
vim parar no seu jardim
Meu desejo é descobrir
como vou fugir de mim

– Já é a segunda vez
que sinto esse desgosto
Eu escuto a sua voz
mas não vejo o seu rosto
Saia do esconderijo
se você está disposto

– Se escondo minha face
não escondo meu desejo
que percebo ser imenso
toda vez que eu lhe vejo
Pois declaro ser você
a estrela que almejo

– Ai Romeu! Agora vou
consoante a meu apreço
pedir que o cavalheiro
conte desde o começo
como foi que outra vez
encontrou meu endereço

– Amparado pelo vento
que soprou em meu favor
pude transvoar o muro
com as asas do amor
Vim pisar num espinheiro
mas colher a minha flor

– Todo espinheiro tem
no momento de florir
seus espinhos afiados
na espreita pra ferir
Mas você no meu jardim
que segredo vem ouvir?

– Minha doce Julieta
me responda com candura
se esta noite retirar-me
sem ouvir a sua jura
o amor que tem por mim
saberei quanto perdura?

– Ai Romeu! Se já estamos
com o mesmo sentimento
eu já posso confessar-lhe
o que penso no momento…
nosso amor é tão profundo
que dispensa juramento

– Esta noite constelada
me deixou tão radiante
que já temo tudo isto
ser um sonho delirante
A beleza de um sonho
dura apenas um instante

– Mas só quero seu amor
com perene sentimento
seja numa noite escura
seja num dia cinzento
Tanto lua quanto sol
mudam a todo momento

– Julieta, eu lhe peço
que me aceite por consorte
ou me deixe para sempre
lamentando a minha sorte
Para ter o seu amor
eu não temo nem a morte

– Eu não posso recusar
um amor que é tão intenso
Mas afoitos poderemos
cometer um erro imenso
Um conselho ajuizado
vá pedir a frei Lourenço

– Julieta, com você
escutar eu não queria
o anúncio da aurora
no cantar da cotovia
pois eu deixarei você
ao chegar o novo dia

– Pode ser até melhor
apressar sua partida
pois nós temos que agir
com a cautela devida
pra um retorno ditoso
vir depois da despedida

Nisso uma das criadas
chamou a jovem senhora
ordenando que entrasse
para dentro sem demora
Despedindo-se os dois
o mancebo foi embora

Quando foi no outro dia
e nos outros deste mês
o que aconteceu com eles
eu já conto pra vocês
Pra casar com a donzela
o mancebo o que fez?

Ele foi pedir ao frei
que fizesse o casamento
Frei Lourenço todavia
veio com o argumento
que em rixa de famílias
não havia um isento:

– Se eu fizer o himeneu
ambos vão correr perigo
transformando a cidade
em território inimigo
Se casar com Julieta
vão morar em um jazigo

– Uma grande injustiça
isso é para eu e ela
Nem sabemos quando foi
o começo da querela
Essa rixa não é nossa
mas da nossa parentela

– Quando Escalo estiver
de passagem por Verona
eu prometo que farei
a verdade vir à tona
sobre todo o problema
que a querela ocasiona

– Como posso esperá-lo
se o tempo por engano
faz um dia ser um mês
a semana ser um ano
e a gota dos anseios
é maior que o oceano?

– Qual seria o motivo
pra ser apressado assim?
Não farei seu casamento
sem você provar pra mim
que essa flor não é apenas
só mais uma no jardim

– Sinto agora a ventura
de quem ama e é amado
Todo ódio ao inimigo
já é coisa do passado
Sempre que amor triunfa
o rancor sai derrotado

Mas vamos deixar o frei
conversando com Romeu
para ver com Teobaldo
o que foi que aconteceu
desde que viu o rapaz
na mansão do tio seu

Desde cedo já estava
percorrendo a vizinhança
com parentes e criados
reclamando por vingança
Encontrando com Mercúcio
foi fazer uma cobrança:

– Cavalheiro, eu já sei
que é amigo de Romeu
Mas o biltre por aqui
hoje não apareceu
Eu só quero que me diga
onde ele se escondeu

– Eu não sou o seu criado
pra lhe dar satisfação
Se procura por duelo
eu resolvo a questão
Mas se quer só debater
vá em outra direção

Teobaldo prontamente
empunhou a sua espada
desferindo um só golpe
com a arma afiada
pra deixar ali no chão
uma linha desenhada

– Eu prefiro um duelo
que a sua ladainha
É perdido discutir
com espada na bainha
Você pode começar
avançando nesta linha

Teobaldo e Mercúcio
com as armas empunhadas
começaram a dar golpes
desviando as estocadas
Todos dois eram velozes
no manejo das espadas

– Teobaldo, a vantagem
que eu tenho é real
Se eu nunca tive medo
das tocaias do rival
avalie num duelo
de igual para igual?

Teobaldo provocado
arrojou-se para frente
com afundos e diretos
envolvendo o oponente
que só pode responder
com arresto eficiente

Mas Mercúcio acuado
viu chegando de surpresa
os criados de Romeu
saindo em sua defesa
com espadas retiradas
da bainha com presteza

Entretanto precisava
calculando o flagelo
impedir a investida
do ataque paralelo
já que estavam lutando
pelas regras do duelo

De repente Teobaldo
num movimento brutal
fez o golpe que levou
o combate pro final
sem Mercúcio desviar
da balestrada fatal

E Mercúcio bambeou
percebendo-se perdido
Foi caindo devagar
totalmente combalido
como cipreste que foi
por um raio atingido

A derrota de Mercúcio
foi pra todos o sinal
que faltava pro começo
duma batalha campal
Veroneses assistiram
propagando-se o mal

Com a rixa acontecendo
mesmo no clarão do dia
pra vergonha de Verona
nesta praça se ouvia
um terçado de espadas
em soturna sinfonia

Partidários das famílias
se lançaram nesta luta
Com a desrazão ficando
no comando da disputa
ninguém mais abria mão
de usar a força bruta

Um servidor de Romeu
cujo nome era Gregório
com pendor para brigar
conhecido e notório
disse para Teobaldo
com o tom acusatório:

– Teobaldo, seu infame
nesta praça me enfrente
Sou rival dos Capuletos
e Romeu está ausente
O Mercúcio de Montéquio
nem sequer era parente

E os dois arremetendo
como feras atiçadas
começaram velozmente
a terçar suas espadas
procurando com destreza
acertar as estocadas

Teobaldo tendo sido
adestrado na infância
no manejo da espada
com extrema elegância
bloqueava e revidava
conservando a distância

E Gregório espadachim
pelas ruas adestrado
feito um gladiador
que golpeia alucinado
tinha força e rapidez
pra lutar desassombrado

Se Gregório golpeava
fortemente com o braço
Teobaldo respondia
com firmeza no rechaço
atacando novamente
sempre com desembaraço

Contra afundos e ataques
cada vez mais agressivos
Teobaldo executava
movimentos defensivos
sem deixar de responder
com diretos sucessivos

Mas Gregório conseguiu
com manobra inusitada
desarmar seu oponente
pela alça da espada
que puxada com vigor
para longe foi lançada

Nesse entre o Benvólio
que era primo de Romeu
no cenário da refrega
constrangido apareceu
pra pedir o fim da luta
a quem era amigo seu

Teobaldo que estava
se sentindo humilhado
percebendo seu rival
totalmente equipado
pra fazer provocação
deu a ele um recado:

– Você vem falar de paz
com espada e escudo?
Vamos ver quem é melhor
no brandir do aço agudo
e quem deixará primeiro
o seu oponente mudo…

Ao fazer o desafio
da peleja prolongada
viu a arma de Mercúcio
no terreno abandonada
Sem nenhuma hesitação
foi pegar aquela espada

E Gregório contrafeito
por tamanha ousadia
dando carga novamente
com a sua arma fria
disse para Teobaldo:
– Acabou a cortesia!

Com vantagem da fazer
a investida primeiro
num movimento veloz
dando um golpe certeiro
fez o outro antecipar
seu momento derradeiro

O criado de Romeu
com rebeldia selvagem
derrotava Teobaldo
um mancebo de linhagem
enganado no perigo
do impulso da coragem

A cidade em alvoroço
pelas refregas na praça
via mais uma contenda
terminando em desgraça
com os mortos e feridos
resultantes da arruaça

Com a briga perdurando
sem fazer um intervalo
veronenses festejaram
a presença de Escalo
que chegava com escolta
imponente em seu cavalo

Os soldados no terreno
avançaram confiantes
com a ordem de somente
dispersar os litigantes
e prender os responsáveis
pelas baixas resultantes

Pois o criado Gregório
pelo crime cometido
acusado pelo povo
por soldado foi detido
e depois de algemado
foi pra cela conduzido

A refrega das famílias
fez Escalo com urgência
convocar no outro dia
necessária audiência
pra punir os causadores
de tamanha turbulência

Julieta no cortejo
do seu primo estimado
chorou vendo Teobaldo
no esquife carregado
amparada pelo padre
que estava do seu lado

E Romeu também chorou
no velório do amigo
Nunca imaginou Mercúcio
indo cedo ao jazigo
por meter-se num duelo
desdenhando o perigo

Pois Escalo resoluto
ao depois dos funerais
fez valer o seu poder
convocando os rivais
juntamente com o frei
testemunhas e que tais

Com a sua autoridade
exigindo obediência
para os antagonistas
fez pesada advertência
Conhecendo o problema
disse para a audiência:

– Eu vejo que em Verona
chegaram dias cinzentos
pois a rixa encontrou
os seus piores momentos
com vocês se enfrentando
em combates violentos

– Todo povo pede o fim
da sua guerra privada
por não suportarem mais
ver a paz ameaçada
toda vez que vocês vão
enfrentar-se na espada

– Como filhos estimados
de famílias valorosas
perdem toda sensatez
em refregas rancorosas
se ferindo fatalmente
feito feras furiosas?

Respondeu padre Lourenço:
– A cidade está refém
duma rixa de famílias
que de longos anos vem
e foi esse o motivo
do conflito mais recém

– Pra fazerem um duelo
basta apenas um insulto
Pelas praças e vielas
um conflito toma vulto
e a briga entre dois
se transforma em tumulto

– Se vendeta é tratada
como se fosse um legado
um pendor pra amizade
quando é silenciado
só resulta em rancor
sendo mais exacerbado

– Tendo eles o ensejo
para darem-se as mãos
nunca perderiam tempo
com os seus duelos vãos
mas teriam a conduta
de amigos ou irmãos

– Sem ninguém oferecer
uma trégua ao rival
veio a querela chegar
no estado atual
onde até um – Por favor!
é ofensa pessoal

E Montéquio respondeu:
– É preciso que se diga
ser o próprio Teobaldo
o provocador da briga
por andar sempre nas ruas
procurando por intriga

Capuleto as palavras
de Montéquio escutando
disse que era suspeito
quem estava acusando
e provando o argumento
foi a ele retrucando:

– Todos sabem o motivo
da querela mais recente
Essas brigas começaram
por Romeu estar presente
em minha casa no baile
pra zombar da nossa gente

Percebendo que o debate
estava ficando tenso
e pra defender Romeu
o franciscano Lourenço
quis também argumentar
apelando ao bom senso:

– Mesmo estando Romeu
nesse ambiente hostil
não existe em Verona
um mancebo mais gentil
e no baile foi somente
por impulso juvenil

– E na festa conheceu
Julieta, a jovem bela
Por ficar apaixonado
quer casar com a donzela
Pra vocês é o ensejo
de findarem a querela…

Respondeu-lhe Capuleto:
– Eu não vejo solução
que seja mais sem valia
pra acabar uma questão
que escorarmos um acordo
nos caprichos da paixão

– Foi a Páris, o fidalgo
a mão dela prometida
e a outro pretendente
não será ela estendida
Este enlace é o sonho
que sempre tive na vida

– Antes de ver Julieta
celebrando o himeneu
com Montéquio por marido
mesmo que seja Romeu
eu prefiro minha filha
desposando com plebeu

E Montéquio retrucou
com ataque pessoal:
– Reconheço que a moça
tem requinte sem igual
seu defeito é ter nascido
na família do rival

Um debate acalorado
foi ali se prolongando
O que um deles dizia
outro ia retrucando
Só o verbo discordar
foram eles conjugando

Ao depois de examinar
tudo quanto fora dito
viu Escalo estar longe
o desfecho do conflito
e pedindo a palavra
fez então o veredito:

– Eu decreto que por ter
o tumulto provocado
seja o jovem Montéquio
de Verona exilado
Vai ter pena capital
se aqui for encontrado

– Vai Gregório para forca
pelo crime praticado
Não escutarei apelos
no que está sentenciado
Com as partes sem acordo
vale o que foi decretado

A esposa de Montéquio
quando soube que o filho
tinha sido obrigado
a deixar seu domicílio
com tristeza lamentou
o castigo do exílio

Seu marido disse a ela
não querendo ser ranheta:
– É melhor para Romeu
pelo risco da vendeta
e também porque precisa
esquecer de Julieta

O franciscano Lourenço
ao mosteiro retornando
viu Romeu e Julieta
no recinto se abraçando
Disse a eles com dureza
os abraços censurando:

– Não posso deixá-los sós
nem ao menos um momento?
Pra ciência de vocês
não farei seu casamento
pois Escalo ordenou
de Romeu o banimento…

Para o jovem casal
frei Lourenço anunciou
a sentença de Escalo
e com detalhes contou
no salão da audiência
tudo quanto se passou

Receberam a notícia
em consternação imensa
Mesmo eles conhecendo
toda aquela desavença
todos dois consideraram
ser pesada a sentença

Mas o padre a Romeu
disse com severidade:
– Eu preciso avisar
mesmo que me desagrade
que você deve deixar
hoje mesmo a cidade

O mancebo respondeu:
– Não é dela e nem minha
a razão de na cidade
ser a morte comezinha
e famílias pelejarem
como galos numa rinha

– Sua ida insensata
na mansão do inimigo
não somente colocou
sua vida em perigo
como ainda fomentou
o antagonismo antigo

Relutante o mancebo
concordou com a saída
perguntando à Julieta
antes da sua partida
que palavras tinha ela
para sua despedida:

– O que sinto por você
é tão grande que não meço
O meu verdadeiro amor
cresceu mesmo em excesso
que está se recusando
em palavras ser expresso

– Dessa vez nos afastamos
num momento doloroso
mas mantenha a esperança
de um retorno ditoso
Não há outro cavalheiro
que eu deseje por esposo

– E querendo confirmar
com firmeza meu pendor
vou lhe dar este anel
em sinal do meu amor
pois só casará comigo
quem for dele portador

Recebendo aquele anel
como a uma honraria
para Mântua o mancebo
viajou no mesmo dia
sem contudo esconder
a tristeza que sentia

E depois que o rapaz
ia longe na estrada
o frei disse à donzela
que para vê-la casada
o pai dela adiantou-se
com a data já marcada:

– O seu pai já decidiu
que fará seu casamento
antes que possa Romeu
retornar do banimento
sem ao menos esperar
pelo seu consentimento

– Como poderei ficar
esperando por Romeu
se o padre não puder
suspender este himeneu
nem quiser ser solidário
com o sentimento meu?

– No fidalgo você tem
um esposo com fineza
que suplanta a Romeu
em poder e em riqueza
pondo a sua família
na linhagem da nobreza

– Mesmo que o seu amor
seja apenas ilusão
é Romeu o cavalheiro
que tem o meu coração
O anel que dei a ele
não será de outra mão

– Reconheço preferir
vê-lo como seu esposo
que vocês podendo ter
um futuro mais ditoso
fazem o rancor sair
de um ciclo vicioso

– Se não quiserem fazer
o desejo dos seus pais
vocês dois tem que fugir
pra não terem nunca mais
a injusta obrigação
de se tornarem rivais

– Poderemos nos casar
mesmo longe de Verona
Não importa se vou ser
abastada ou pobretona
O frei não deve saber
como isso funciona…

– O que sei é que vocês
se amam do mesmo tanto
não podendo ser felizes
cada qual no próprio canto
mas só tenho uma idéia
pra ajudá-los no entanto

– Como vejo que você
já está determinada
me arrisco em apelar
pra medida extremada
Vou lhe dar uma poção
pra ficar desacordada

– O seu corpo vai ficar
em completa letargia
e assim não poderá
levantar da cama fria
parecendo ter você
falecido nesse dia

– E vão colocar você
numa sepultura aberta
Com dois dias de torpor
ao depois você desperta
Eu escrevo uma carta
pra deixar Romeu alerta

– Recebendo meu aviso
saberá o que se deu
Nessa noite no jazigo
chegaremos ele e eu
e pra longe de Verona
você foge com Romeu

Com a idéia do frei
Julieta concordou
e pegando a poção
para casa retornou
Que estava pra casar
sua mãe lhe avisou

Como ela não queria
o fidalgo por consorte
viu a moça que chegara
o momento de ser forte
pra no teatro da vida
encenar a sua morte

Bebeu todo o elixir
e desde aquele momento
seu corpo inteiro ficou
sem cor e sem movimento
como se fosse um moinho
esperando pelo vento

Quando a sua criada
escutando a cotovia
foi até o quarto dela
no raiar do outro dia
presumiu que Julieta
inda na cama dormia

Percebendo que a dama
inda estava vestida
de repente pareceu-lhe
que tinha perdido a vida
começando a lamentar
com tristeza incontida

Quando a mãe de Julieta
viu a morte na donzela
com o trauma de perder
filha singular e bela
declarou só o desejo
de morrer junto com ela

Essa mesma confissão
fez a elas seu marido
ao dizer que preferia
ter no leito falecido
do que ver precocemente
sua filha ter partido

Conde Páris ao chegar
expressou o sentimento
de ter sido enganado
pela morte no momento
que esperava consumar
seu amor no casamento

Junto dele Frei Lourenço
disse para o casal
que agora se ocupassem
preparando o funeral
pra honrar a sua filha
com o seu adeus final

A cidade já estando
contrafeita com o erro
que foi feito com Romeu
na sentença do desterro
inda mais se comoveu
com a moça no enterro

Nesse entre Baltasar
um criado de Romeu
avexado em seu cavalo
foi até o chefe seu
abalando o mancebo
com a notícia que deu

Pois o jovem decidiu
por ficar desesperado
ir até um boticário
e comprar um preparado
fomentando o desejo
de morrer envenenado

E o frei ficou sabendo
que a carta enviada
para o jovem Romeu
chegaria atrasada
relatando o mensageiro
embaraços na estrada

Lamentando o imprevisto
da ausência de Romeu
mas com o tempo correndo
frei Lourenço resolveu
prosseguir com o seu plano
indo até o hipogeu

O rapaz que desejava
ver ao menos a donzela
pela derradeira vez
para despedir-se dela
retornou para Verona
desprovido de cautela

Sem querer se consolar
por tamanho desencanto
como se fosse um viúvo
derramando o seu pranto
Conde Páris, o fidalgo
foi também ao campo santo

Quando Páris viu Romeu
adentrando o mausoléu
quis que ele se rendesse
com a condição de réu
sem querer considerar
que o desterro foi cruel

Por Romeu não concordar
com sua voz de prisão
foi chamado orgulhoso
agravando a discussão
Se puseram a brigar
com suas armas na mão

Para o fidalgo Páris
o confronto foi fatal
Entre ataque e defesa
recebeu golpe mortal
A conduta por impulso
foi um erro crucial

Com o jovem lamentando
seu impulso repentino
aumentou sua aflição
por aquele desatino
pois sentia-se igual
um joguete do destino

O fidalgo esmorecendo
só pediu pra ser levado
ao lugar que Julieta
ficaria do seu lado
que somente com a dama
desejava ter casado

Só então que o mancebo
percebeu com quem lutou
e pra dentro do sepulcro
com presteza o carregou
Perto da sua donzela
o fidalgo ele deixou

Sem alguém pra consolar
os suplícios de Romeu
o rapaz abriu o frasco
do veneno e o bebeu
Deu um beijo em Julieta
um suspiro e morreu

Nesse entre frei Lourenço
foi chegando no lugar
no momento que a donzela
começava a despertar
O que estava acontecendo
ela veio a indagar

Frei Lourenço disse a ela
que Romeu estava morto
feito o barco naufragado
sem retorno para o porto
e só ele estava ali
para dar-lhe um conforto

Prometendo que a faria
ingressar em um convento
disse que havia pressa
pra deixar o monumento
percebendo que os guardas
chegariam num momento

Pretextando despedir-se
ela quis ficar sozinha
com Romeu no mausoléu
que o luto lhe convinha
escondendo de Lourenço
uma intenção que tinha

Quando o padre retirou-se
a donzela entristecida
deu um beijo em Romeu
pra fazer a despedida
e pegando a sua adaga
encurtou a própria vida

Mas o pajem do fidalgo
tinha a todos avisado
Dom Escalo ja chegava
pelos guardas escoltado
Com as famílias rivais
vinha ele acompanhado

O franciscano Lourenço
pela ronda foi trazido
por ter sido encontrado
entre pranto e gemido
figurou como suspeito
precisando ser ouvido

Pois o padre relatou
tudo quanto aconteceu
na história adversa
de Julieta e Romeu
e o que tinha de culpa
no procedimento seu

Quando ele terminou
toda a sua explanação
as famílias prantearam
com profunda comoção
lamentando o ocorrido
sem conter a emoção

Só então os patriarcas
quiseram selar a paz
apertando-se as mãos
sem a fúria contumaz
inspirados pelo drama
da donzela e do rapaz

E Montéquio prometeu
que faria à Julieta
esculpida só em ouro
uma linda estatueta
pra Verona apreciar
a figura da ninfeta

Capuleto percebendo
na oferta um presente
disse ainda comovido
que faria igualmente
a figura de Romeu
feita de ouro somente

FIM

Paixão ou Loucura

No pensamento te sonho mesmo acordado.

Sinto-te comigo mesmo não estando presente.

Teu cheiro me ronda apesar de estar distante.

Parece castigo te vejo em tudo, até mesmo na chuva que cai…

Quem hoje é a minha tormenta, já foi a bonança…

E eu sei que é inútil fugir das lembranças,
porque do meu corpo teu cheiro não sai…

Sinto a tua presença constantemente!

Habitas em meu sangue,
em meus pensamentos e em cada célula de meu ser.

Bendita tortura!

Eliezer Lemos

Quero ser o teu amigo

Nem demais e nem de menos.

Nem tão longe, nem tão perto.

Na medida mais precisa que eu puder.

Mas amar-te, sem medida,
e ficar na tua vida da maneira mais
discreta que eu souber.

Sem tirar-te a liberdade.

Sem jamais te sufocar.

Sem forçar tua vontade.

Sem falar quando for hora de calar,
e sem calar, quando for hora de falar.

Nem ausente nem presente por demais,
simplesmente, calmamente, ser-te paz…

É bonito ser amigo.

Mas, confesso,
é tão difícil aprender!

E por isso eu te suplico paciência.

Vou encher este teu rosto
de lembranças!

Dá-me tempo de acertar nossas distâncias.

Eliezer Lemos