Que o outro saiba
quando estou com medo,
e me tome nos braços
sem fazer perguntas demais.
Que o outro note
quando preciso de silêncio
e não saia batendo a porta,
mas entenda que não o amarei
menos por que estou quieta.
Que o outro aceite
que me preocupo com ele
e não se irrite com minha solicitude,
e se ela for excessiva saiba me dizer isso
com delicadeza ou bom humor.
Que o outro perceba
minha fragilidade,
e não ria de mim,
nem se aproveite disso.
Que se eu faço uma bobagem,
que o outro goste um pouco mais de mim,
porque também preciso
fazer tolices tantas vezes.
Que se estou apenas cansada,
o outro não pense logo que estou nervosa,
ou doente, ou agressiva,
nem diga que reclamo demais.
Que o outro sinta
quanto me dói a idéia da perda,
e ouse ficar comigo mais um pouco,
mas talvez seu medo, ou sua culpa,
em lugar de voltar logo à sua vida,
não porque lá está sua verdade,
Que se começo a chorar sem motivo
depois de um dia daqueles,
o outro não desconfie logo
que é culpa dele,
ou que não o amo mais.
Que se estou numa fase ruim,
o outro seja meu cúmplice,
mas sem fazer alarde, nem dizendo
"Olha que estou tendo muita
paciência com você"!
Que se me entusiasmo por alguma coisa,
o outro não a diminua,
nem me chame de ingênua,
nem queira fechar
essa porta necessária
que se abre para mim,
por mais tola que lhe pareça.
Que, quando sem querer,
eu digo uma coisa bem
inadequada diante de mais pessoas,
o outro não me exponha
nem me ridicularize.
Que quando levanto de madrugada
e ando pela casa,
o outro não venha logo
atrás de mim reclamando:
”Mas que chateação essa sua mania,
volta pra cama!”
Que se eu peço um segundo
drinque no restaurante,
o outro não comente logo:
"Poxa, mais um?"
Que se eu eventualmente perco a paciência,
perco a graça e perco a compostura,
o outro ainda assim me ache linda
e me admire.
Que o outro, filho,
não me considere sempre disponível,
sempre necessariamente compreensiva,
mas me aceite quando não estou
podendo ser nada disso.
marido,
amante,
amigo,
Que, finalmente,
o outro entenda que mesmo
se às vezes me esforço,
não sou, nem devo ser,
a mulher-maravilha,
mas apenas uma pessoa:
vulnerável e forte,
incapaz e gloriosa,
assustada e audaciosa,
apenas…
"uma mulher".