O MERCADOR

Compre-me e me guarde como escravo,
Tu és cravo, tu és rosa,
Tu és verso, tu és prosa,
Para que deitares assim?
Esqueça-te do medo e venhas mais perto de mim.
Quando tudo acabar, somente um anjo te dará a mão,
Talvez um anjo triste que não merecerá sorriso nem atenção.
Mas de qualquer maneira, serás sempre uma poesia,
Tenra e pura, de águas infinitas e brilho intenso.
Tu és um afresco onde se pintam as sublimes renascenças,
Tu és o perfume sentido e guardado à sombra dos parreirais,
E quanto mais penso, menos razão me dou.
Não sei o que me toma, não sei o que me come,
Não sei o que resta e nem o que me consome,
Mas sei que alguma coisa não está correta.
Tu fizeste o mal virar bem!
Tu fizeste da morte algo real!
Tu mataste comigo, e juntos vimos o mundo brilhar.
Estás entorpecendo-me a cada dia,
Estás envolvendo-me em tuas redes vazias,
E não há mais nada que eu possa fazer.

OLHOS

Seu coração blindado será o motivo da minha perdição,
Tentar entender seus mistérios, desvendar seus sonhos,
tornou-se a ébria obsessão.
Gostaria de não estar em seus devaneios antes de dormir,
assim, saberia que sou real.
Mas não entendo sequer qual minha origem,
como entender minha realidade?
Os anos que virão são como cortina de fumaça,
Tornando-se cada vez mais intensa,
Talvez mais para sufocar do que para escurecer.
Amante do carinho, estou indo até você.
Encontre-me quando já for tarde e me traga o que é seu.
Vamos dividir tudo o que nos pertence, e tornemo-nos um em outro.
E quando já estivermos cansados e com fome,
iremos procurar algum lugar para pedirmos um pastel.
E a noite terminaria sem qualquer lembrança que devesse ser esquecida.
Mas hoje não me lembro de ontem e a existência está alienada a recordações

UM VELHO TEMPLÁRIO

Você dormiu em meus braços,
E eu naveguei em seu barco.
Você saudou o frio,
E eu lhe dei calor.
Você me prendeu!
E eu sorri sob o monte.
A sua força é audaz, e sua vontade também.
Quando senti o que queríamos,
É que pude me sentir bem.

Você acordou em meus braços,
E um beijo eu lhe dei.
Sua boca com a minha,
E seus olhos procuravam os meus.
No escuro que se mantinha, um presente que a névoa nos deu.
Seria tarde? Seria dia?

Quando a alma está vazia, não há tempo que possa preencher.
E na magnitude do mistério que nos rodeia nós tentamos perceber,
Onde nos faltou o senso de bom senso? Como acordar para descer?
Se alto subimos e aqui estamos!
Debruçados na janela da alma,
Ouvindo um doce rock and roll, o velho que acalma.

JÁ É TARDE

Nas correntezas desgovernadas do rio que desce a serra,
Jogo minha saudade amarga sob um chão frio de terra.
As pedras que encontro servem de assento
Onde espero e conto a chuva cair em destempero, em desalento.
Irá encher minha caixa d´água e também meus olhos lacrimejantes.
Os dois transbordarão juntos, e aguardarão o mesmo instante.
Quererem ver o rio determinado, seguindo seu curso vazio.
Alagando o limpo descampado, chegando forte, porém tardio.
Faça gotejar agora, faça brilhar o sol,
Faça romper a aurora no canto livre do rouxinol.
Já passou longe da hora, de meu peito se encher
E ficar repleto de você.

A VERDADEIRA NOITE FELIZ

Você não precisou dizer nada, e mesmo assim o céu se abriu,
Seus dedos correram e com o tato de suas mãos você fez som.
Rolavam pelas claves as notas, e soava pela sala a magia.
Magia de um futuro pensado, dentro daquilo que será seu dom

De lágrimas se fez minha admiração, de olhos abertos e fatais,
Com as ondas que quebravam diante do toque de suas mãos,
Bosques que cobriam meus quinhões, que sem você seriam lamaçais
Chorei pelo sol entoado, pelo redimido, e aguardei lá a intenção.

São sete pilares que encostados se fazem mágicos,
São infinitos andares que só a emoção não tripudia
Se faz alegre, os sons que sem sua doçura seriam trágicos

Abra a alma para seu sorriso, e com o coração solte sua melodia,
Eu não consigo imaginar, ou pensar num paraíso,
Sem ouvi-la noite adentro vê-la ao raiar do dia.

MATA-ME DE AMOR

Eu vejo uma cor que me encanta em deleite paixão.
É o tom da ternura, coberto com a fúria seca da ilusão
Num corpo novo, de pele dourada e cabelos lisos.
Ainda consigo sentir o ar soturno me despindo do juízo.

Suas mãos livres tocaram apenas o que eu pude notar.
Sua boca rosa, se fez colorida, em cores que quero imaginar,
Mas não posso me deitar, sem antes dar adeus ao sonho
De uma falsa vertigem dentro da altura infinita que proponho.

Saltar, parece loucura. Pode até ser intenso, mas é louco.
Resta-me gritar à pele crua. Grito vazio a plenos pulmões, rouco.
Despi-la ainda quero, mesmo que seja apenas para ver,
Um olhar sincero, que surge mesmo quando erro, perto de você.

Quero ver a marca que o açúcar deixou em curvas.
Um doce encanto, mostrado branco, em meio a pele turva.
Suaviza a força, que explodiu em mantras sagrados,
Eterniza a escada, na busca da rota do céu estrelado.

E as alegorias de uma febre em pele de sabor,
Me dizem o quanto meu corpo ainda precisa de calor.
Eu posso nas passagens de uma paisagem sem lar
Buscar o balde, achar o poço, desenrolar a corda para sua sede matar.

PÊNDULO

Olha o só coração, vê o seu relógio,
Mas não sabe que horas são.
Veja ainda suas veias, entradas abertas,
Uma viagem incerta, paredes feitas de ilusão.

Bate com o toque forte dos ponteiros,
Sente ainda ressaltar o seu tambor,
Não entende se vive apenas passageiro,
Ou se perdeu a linha, a isca pescador.

Aprende que o sangue por ele já passou,
Uma vez ou mais, já não sabe precisar,
Ainda que a si mesmo delegou,
Asas de passarinho sem saber voar.

Voou longe e solitário meu pequeno,
Não tive força ou vontade de impedir,
Tomou chuva, vento forte e sereno,
Viu o sol e não pode mais partir.

Voa alto coração de passarinho
Traga uma rosa para ver se bem me quer,
Não tenho medo de dormir aqui sozinho
Tenho ao meu lado o aconchego de mulher.

Alguém que bateu asas num instante e chegou
Mulher de um nome limpo, puro que não é vão,
Flores de pétalas com o cheiro de quem casou,
Isabel, mulher e esposa me diga que horas são.